“OS MAÇONS OU MAÇONARIAS SÃO ÚTEIS AO REGIME”
Uma análise das representações sobre a francomaçonaria nos
filmes Les forces occultes (1943).
Les Forces Occultes (1943) – A antimaçonaria como propaganda
do regime nazista O filme “Les Forces Occultes” é uma produção francesa do
período conhecido como a França de Vichy.
Costuma-se creditar toda a ação política francesa deste período à ocupação nazista, é importante ressaltar que o colaboracionismo não se devia à mera pressão da ameaça.
O État Français , embora governo fantoche do regime nazista, dava vazão à ideologia vigente, qual seja aquela do catolicismo, do autoritarismo, do Travail, Famille, Patrie (trabalho, família, pátria) e, principalmente para o escopo deste artigo, do antimaçonismo e do anti-judaísmo, ou como ressaltou o ex-Grão Mestre do Grande Oriente da França, Jean-Robert Ragache, do anti-cosmopolitismo.
O média metragem drigido por Marcel Mammy é uma expressão genuína da estética do cinema nazista.
Recorrendo
ao mesmo estilo de narrativa, o filme utiliza também os mesmos efeitos de
câmara-8 já vistos em clássicos como “Der Triumph des Willes” (O Triunfo da
Vontade), “Jude Suss” (O judeu Suss) e Der Ewige Jude (O Judeu Eterno).
A maçonaria estava banida oficialmente do território francês
desde 13 de agosto de 1940 pela lei que proibia o funcionamento de “sociedades
secretas”, certamente a maior visada era a franco-maçonaria, e principalmente
as potências mais importantes, o Grande Oriente da França e a Grande Loja de
França.
Um exemplo desse foco nas potências maiores é que somente no início de 1941 as potências menores, as mistas e as femininas são atingidas pelos decretos de “nulidade” de sua Constituição.
Imediatamente os arquivos
maçônicos caem em mãos nazistas e francesas colaboracionistas, inquéritos
extensos são levados a cabo, lista com os nomes dos maçons franceses são
publicadas em jornais e cerca de três mil funcionários perdem seus empregos por
conta de sua condição de membro da fraternidade.
Mais do que a ''paranóia'' do complô judaico-maçônico-comunista, temia-se que a capilaridade das instituições maçônicas servisse à resistência francesa, situação esta que se concretizou, aumentando em muito a eficiência da resistência.
Os membros da franco-maçonaria estavam acostumados ao silêncio, se
reconheciam de modo discreto e tinham em seus quadros desde carteiros até
industriais, ligações improváveis que fizeram o Governo de Vichy montar um
Serviço Especial para tentar desbaratinar o quebra-cabeças que se apresentava.
É neste contexto que o cinema francês de então lança “Les
Forces Occultes”, uma mistura dos arquivos maçônicos confiscados, embebida da
paranóia nazi-facista.
Não cabe a este artigo fazer uma verificação do que é ou não
é verdadeiro ou verossímil no referido filme, vale somente fazer a ressalva que
muitos maçons quando chamados para depor e confrontados com os documentos
apreendidos afirmavam desconhecer ou não se lembrar, e quando instados a citar
nomes de outros maçons citavam longas listas de maçons de suas lojas, já falecidos.
É bastante provável, embora seja somente uma hipótese, que
algum maçom, prestou o mesmo tipo de “ajuda” aos produtores do filme.
Jean-Marques Rivière, conhecido panfletista anti-maçônico, anti-semita e
anti-comunista, fez o roteiro do filme e na estréia afirmou que se tratava“de
um ato político e revolucionário”.
O trama conta a história de um deputado francês que, como
notamos na seqüência inicial, na qual ele está discursando na Assembléia
Nacional Francesa, é porta-voz da ideologia nacional-socialista.
Dirigindo insultos a todos os partidos, acusando-os de lançar
a França em uma crise e uma ameaça de guerra que estariam na verdade atendendo
os interesses da direita e da esquerda, constrói uma imagem de integridade
acima de qualquer suspeita.
A trama conspiratória se desvela deste modo, desde o
princípio da película; uma divisão clara entre bons e maus, honestos e
desonestos.
Porém o enredo, neste caso, é somente um pano de fundo para o
que seria o grande chamariz do filme, a demonstração, pela primeira vez
filmado, de um ritual maçônico, e como fazia questão de reforçar toda peça de
divulgação da obra “conforme utilizado pelo Grande Oriente da França” à época
da proibição.
Assim que entra para a loja, que abriga em seu seio deputados
de todas as vertentes, Avnel começa a receber pedidos, todos excusos, de
favores em nome da irmandade.
O filme faz referência a famosos escândalos da Terceira
República, estampando, incusive, números do jornal “L’Anti-Maçon”, jornal
dirigido por Léo Taxil, um dos mais famosos propagandistas contra a maçonaria.
Avnel decide então deixar a loja após perceber que a entrada
da França na guerra contra a Alemanha é na verdade um complô
maçônico-judaico-comunista.
Sua decisão se dá após uma discussão dentro da loja e na
mesma noite o deputado sofre um atentado planejado em velocidade recorde por
seus irmãos.
A cena final mostra o triunfo do mal sobre o bem, com o Venerável Mestre da loja, que durante todo o filme é retratado de maneira maléfica, principalmente nos enquadramentos e closes, acima do globo terrestre que está em chamas.
Uma boa definição da estrutura narrativa do filme, que possui o mecanismo da propaganda, foi feita por F.Chevessu na revista Image et Son.
A utilização do filme Les Forces Occultes como propaganda contrária, seja à maçonaria, aos judeus ou a política em geral, não cessou com o fim da França de Vichy.
O filme, disponível na
íntegra online, conta com milhões de acessos e os comentários deixados pelos
espectadores provam que a obra de Mammy ainda ecoa como formador, ou reforço,
de uma certa imagem da maçonaria para grande parte das pessoas.
No presente ensaio analisarei as relações entre a linguagem
do cinema e as representações que esse meio oferece sobre a maçonaria.
destaque pela sua qualidade exemplificativa, dadas as
diferentes formas a partir das quais maçonaria é apresentada ao público.
No presente ensaio analisarei as relações entre a linguagem
do cinema e as representações que esse meio oferece sobre a maçonaria.
destaque pela sua qualidade exemplificativa, dadas as
diferentes formas a partir das quais maçonaria é apresentada ao público.
Tais estudos se tornam bastantes relevantes na medida em que
a maçonaria vem se tornando um tema recorrente nos estudos históricos;
conjugado a esse fenômeno há a maior exposição pública da ordem, provocada, em
grande medida, por obras de ficção.
A formação da percepção do público sobre esta sociedade se
dá, também, por meio do cinema, objeto que procuramos abordar aqui em suas
relações com a história.
Em um primeiro momento será abordado o filme Les forces
occultes, filmado na França ocupada pelos nazistas em 1943.
Essa obra pode ser classificada como exposure, ou seja, que
propõem desvelar algum segredo maçônico, uma vez que fez parte do repertório
doutrinário nazifascista,que alegava a manipulação da política mundial e a
degeneração dos costumes.
O Nacional-Socialismo em vez de fomentar a luta de classes
entre operários e empresários, os únicos que realmente produzem num País,
remeteu-se contra os especuladores, banqueiros, representantes das altas
finanças internacionais e o governo mundial sionista, o que fez com que estes o
perseguissem até a sua destruição total?
Que, na verdade, o Nacional-Socialismo achou o ponto ideal entre o capitalismo e o comunismo, nem deixando tudo ao bel prazer do mercado nem suprimindo as diferenças naturais da sociedade em um igualitarismo forçado: promoveu um regime regulador da economia, permitindo à iniciativa privada sua participação como força empreendedora, ao mesmo tempo em que promoveu um socialismo justo através da proteção ao trabalhador e o estímulo a um sentimento ético universal, a cidadania praticada por todos, indistintamente.
Cinema e História
Longe de ser um cruzamento atual, a interface, ou interpenetração, entre cinema e história é tão longevo quanto a sétima arte.
Data de 1898 o ensaio do polonês Boleslas Matuzewski chamado “Une nouvelle
source de l’histoire: création d1un depot de cinematographie historique”, no
qual o autor expõe sua teoria de que o cinema, por ser uma fotografia animada,
sendo capaz de dar um testemunho verídico dos fatos, controlaria assim os
testemunhos orais; o cinema possibilitaria então a formação de um depósito de
imagens dos fatos importantes, ou nas palavras de Matuzewski “um depósito de
cinematografia histórica”.
Sabemos que o projeto do autor polonês não se concretizou da forma como previu, porém, afora as questões do cinema, e\ou imagem, e a apreensão do real, a chegada das imagens em movimento modificaram de modo indelével o entendimento do processo histórico.
Não somente pelo seu valor documental, como previam uns ou como tentam cercear outros até hoje, mas também por seu valor estético e demais variáveis das quais a história pode, e deve, se ocupar.
Maçonaria
Antes de qualquer outra informação, faz-se necessário responder, de modo bastante geral, porém esclarecedor e não mitificador, o que é a maçonaria.
Maçonaria, ou franco-maçonaria, é uma fraternidade que possui entre seus pilares os valores da fraternidade e do aperfeiçoamento moral e espiritual de seus membros.
Sendo uma ordem iniciática apresenta aspectos filosóficos e místicos, além de ensinamentos distribuídos em um sistema de graus.
Embora, a partir do século
XVIII, a maçonaria procure ligar suas origens a eventos bastante anteriores a
sua formação, seu início está, temporalmente, bastante explícito.
É em meados do século XVII que se tem os primeiros registros da aceitação nas corporações de ofício de pessoas que não intentavam exercer a profissão de pedreiro.
Estes homens eram chamados de “aceitos”, provinham das mais variadas profissões, porém eram em sua maioria comerciantes e proprietários, os motivos de suas filiações derivam da popularidade que o modelo de sociabilidade das guildas exercia em toda a Europa à época.
Hobsbawm, em seu artigo sobre os rituais do operariado, sublinha o modelo que daria origem à franco-maçonaria como sendo um dos mais copiados dentre os diversos modos de sociabilidade dos operários.
O declínio das corporações de ofício e a iniciação de membros estranhos às guildas formam o início do que conhecemos como maçonaria hodiernamente.
Para fins de caracterização costumou-se chamar a maçonaria ligada às corporações de ofício de maçonaria operativa e àquela formada exclusivamente por “aceitos” de maçonaria especulativa, pois o trabalho, outrora real e material, passava agora a ser simbólico e intelectual.
O final do século XVIII e todo o século XIX são fundamentais para a construção da identidade da maçonaria moderna.
A filosofia do iluminismo, tanto em sua vertente francesa quanto na do Aufklärung alemão, o evento político da revolução francesa, a codificação da doutrina espírita, o misticismo ''rosacruciano'' e cabalista, além das práticas mágicas que floresceram por toda parte nos anos 1800, todas estas correntes exerceram forte impacto sobre a maçonaria que, a partir daí, imprimiu de modo indelével sua característica mais marcante: o sincretismo.
Muito embora seja uma árdua tarefa escrutinar os primórdios da maçonaria, especialmente sua transição de operativa para especulativa, há um marco fundacional que é ponto pacífico para a maioria dos autores: a fundação da Grande Loja da Inglaterra, em 1717, vista desde então como a “loja mãe” e garante da legalidade das demais lojas maçônicas mundo afora .
Este papel da Grande Loja da Inglaterra como árbitro do que é chamado pelos maçons de “regularidade” é bastante questionado atualmente.
Logo após um conjunto de maçons, tendo a frente o Reverendo John Anderson, sistematiza os antigos diplomas legais sobre os direitos e deveres dos maçons e, com algumas adaptações, publicam a primeira constituição maçônica, no ano de 1723.
O que de mais importante consta neste documento são os landmarks, conjunto de regras e posturas que devem ser observadas por todas as lojas e maçons a fim de que sejam consideradas regulares.
Esses landmarks são as cláusulas pétreas da maçonaria regular mundial.
À partir o século XVII, a maçonaria espalhou-se pelo mundo.
Seus modelos de rituais e de sociabilidade foram amplamente copiados por uma série de sociedades secretas, sindicatos e uniões operárias.
Construir uma história da maçonaria no mundo requer uma sistematização de
milhares de trabalhos que vem sendo produzidos por maçons e historiadores desde
a iniciação dos “aceitos”.
Porém, o que faz a história da maçonaria tão confusa, para historiadores e maçons, é a falta de uma sistematização mínima destas múltiplas narrativas (que envolvem desde relatos fartamente documentados, até folhetos com pseudônimos dizendo que a maçonaria foi criada por Jesus Cristo) além da questão do segredo, que embora essencial para a maçonaria não representa obstáculo instransponível para que se possa lançar em estudos sobre seus mais variados aspectos antimaçonaria.
Grande é a tendência nos dias atuais de chamar de
antimaçonaria tudo que a ela se opõe.
Porém há de se diferenciar o que são críticas à ordem maçônica, seja pela sua estrutura, filosofia e\ou atitudes enquanto organização e o que são opiniões contrárias à maçonaria advindas de preconceitos ou distorções propagadas desde o século XVII, ou seja, desde a estruturação da maçonaria moderna.
Muitos são os exemplos e histórias de antimaçonaria; para analisarmos da maneira mais breve e sistemática façamos uma síntese.
Desde que a maçonaria foi sistematizada na Inglaterra, no século XVIII, a antimaçonaria foi o seu inevitável subproduto, de variados matizes e motivações os discursos contra a ordem adquiriram vigor e sofreram mutações, tornando possível sua permanência até os dias atuais.
Dentre os discursos antimaçônicos podemos citar
três bastante profícuos e que, de certo modo, deram origem aos demais.
Assim, a antimaçonaria tem sido um dos principais feixes de lenha na fogueira das “teorias da conspiração”.
O tão propalado “segredo maçônico” ajudou a alimentar ainda mais a imaginação daqueles que possuem uma relação de amor, ódio ou curiosidade com a instituição.
A maçonaria virou uma
espécie de peça coringa no quebra-cabeças das teorias conspiratórias que, dada
sua natureza, moldam-se conforme o desenho que se quer como resultado.
Cinema e Maçonaria
A maçonaria tem sido um tema recorrente no cinema, de maneira explícita ou aparecendo como parte do contexto ou de pano de fundo.
Porém no filme abordados neste artigo temos presentes os
aspectos, pois não somente a análise de seus entornos de produção nos dão
elementos que atestam sua força como valor de testemunho como também seus
aspectos estéticos nos fornecem dados cruciais sobre o tema que aqui desejamos
tratar.
O aspecto que este filme possue em comum, além de tocarem na
temática “maçonaria” é que foi produzido dentro de um regime de exceção ou
extrema polarização política.
Assim buscaremos perceber como foi possível e recepção e a
produção de uma dada representação sobre a maçonaria no contexto.
Como forma de tornar a fraternidade um párea desejoso por
destruir a sociedade, que podem ser perigosos e
a banalidade e servilidade de uma ordem que busca a manutenção do status
quo que mesmo assim por ele são tragados.
É importante ressaltar que entenderemos representações juntamente a Moscovici na sua leitura dentro da psicologia social, principalmente como o que o autor assinala como sendo as duas principais funções das representações, que são.
Assim, buscaremos observar de que modo
ocorrem estas convenções do que é a maçonaria, de que forma estas convenções se
inscrevem na sociedade sintetizando visões a seu respeito e como estas obras
prescreveram modos de perceber o fenômeno social da maçonaria em suas
sociedades.
LEIA O POST:
A INFLUÊNCIA DOS MAÇONS OU DA MAÇONARIA NA POLÍTICA DE ESTADO E DE GOVERNO DO BRASIL
https://aveanarco.blogspot.com/2020/11/a-influencia-dos-macos-ou-da-maconaria.html
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